terça-feira, 24 de agosto de 2010

É a falar…

Sinto um abandono dilacerante, uma perda inabalável, um conforto revestido a desconforto, um ganho sem nunca ter perdido, e perdido estás sem mim.

Sinto que não te perdi, mas sinto que me perdeste porque assim o entendeste, alcance de mão que sempre terás, estendida, para me teres, para te recuperares, para renasceres.

Sinto que já não corres atrás mas sim à frente do que já não queres perder, verdade, vontade, realidade que te brota no peito, que te racha a alma, que faz sangrar pelos olhos.

Sinto que agora te limpas da poeira que projectaram sobre nós, rasto do que nunca tiveram e que tu terás muito mais, sempre, porque não existe nada igual, porque só eu moro ai.

Sinto te, presente, perto, tão perto que me mete medo, que me faz exaltar as noites, que me faz rolar a memória, quantas vezes traças a minha rua, só para me teres mais junto a ti.

Sinto que vivo, e vivo cada vez mais, na tua pele, na tua respiração, mais do que há na razão, mais do que o pensamento comporta, pois na realidade pouco mais importa.

Sinto a tua mão na minha, sinto o teu respirar, sinto um arrepio na espinha, sinto te a cheirar, sinto te sem ar, sinto te dentro do meu palpitar, sinto que te faço andar, sinto te a inalar me!

Sinto a tua saudade, o teu desespero, o teu sofrer antecipado daquilo que já não recrimino, daquilo que já não faz sentido, daquilo que não valorizo, daquilo que não importa, daquilo que já não tem valor.

Sinto que ainda queres falar, falar como antes, numa noite sem mais ninguém, falaste até ao amanhecer, num aconchego profundo, num sono embalado pelas palavras livres, sem medo de errar…